ENTRE O MANUSCRITO NA GAVETA E O POEMA QUE PULSA

Giovani Miguez • 24 de junho de 2025

Esboços de uma autocrítica


Olhar para a própria produção é um exercício de estranhamento e reconhecimento. De um lado, vejo o projeto finalizado, maturado, que aguarda o momento certo para encontrar o mundo: o livro "Poéticas do Cuidado, das Brevidades e das Suturas". Do outro, sinto o pulso do agora, o registro diário de um fazer poético que ainda não tem forma definida: o manuscrito em curso que chamo de "Poemas 2025". Um é a tese; o outro, o laboratório.


O projeto curado: a arquitetura de "Poéticas do Cuidado"


Em Poéticas, minha intenção foi criar uma jornada com começo, meio e fim. Busquei organizar minhas inquietações em um percurso que se desdobra em três atos, produto de três meses de produção; ou seja, julho, agosto e setembro de 2024. Embora circunstritos temporalmente, estes poemas tiveram uma curadoria que não se restringiu a temporalidade de produção dos mesmo, como faço costumeiramente em meus livros. Desta forma, organizei-os do seguinte modo:


"Das Brevidades"
é o meu convite para encontrar poesia nos instantes fugazes do cotidiano. É onde o poema se torna um espelho, refletindo a "nostalgia na sala" ao ver os filhos dançarem ou o afeto que "não cabe neste poema breve".


"Do Cuidado", o coração da obra, é onde aprofundo a premissa de que "o ato poético é um ato de cuidado". Nele, exploro a necessidade de uma "Sociedade do Cuidado" e a força dos laços em poemas como a "Ode ao Abraço".


Por fim, em "Das Suturas", encaro a palavra como um fio que costura as feridas existenciais. Ali, afirmo que, se não posso curar, posso ao menos suturar "com a palavra enquanto por ela sou também suturado". É o espaço para lidar com a traição, a injustiça social 13 e os lamentos políticos.

Este livro é um projeto fechado, uma declaração de poética. Ele está pronto, guardado na gaveta, esperando o momento em que suas palavras possam, de fato, abraçar o leitor.


O laboratório aberto: a fluxo de "Poemas 2025"


Se Poéticas é a casa arrumada, Poemas 2025 é o ateliê em plena desordem criativa. Sua estrutura não é temática, mas cronológica, seguindo o fluxo dos meses. É um registro mais cru e imediato da minha relação com o mundo e com a própria escrita. Nele, os temas que estruturei em Poéticas aparecem de forma mais espontânea. A crítica social se torna mais ácida e direta, como em "JOGO SUJO", onde manifesto minha repulsa a uma figura política específica, ou em "CONSTRUÇÃO", onde exponho a invisibilidade do operário.


A
metapoesia, que em Poéticas é um conceito que amarra a obra, aqui se torna um desabafo sobre o próprio ofício. Em "APEGOS CRIATIVOS", admito: "escrevo apenas sobre o que vejo, sinto, desejo e pressinto". Em "PENSAMENTO MATINAL", revelo minha dificuldade de socializar quando a poesia não me visita durante a noite. Há também mais espaço para a experimentação formal, como a tentativa de um "SONETO AOS CÍNICOS", que foge do meu verso livre habitual.


Diálogos e senões: o polido e o bruto


Colocando os dois trabalhos lado a lado, percebo um diálogo constante. Poemas 2025, embora posterior e ainda em curso, é, em muitos momentos, o rascunho bruto das ideias que poli para Poéticas. A busca por enxergar poesia em um simples copo com água, por exemplo, é a própria essência de "Das Brevidades".


Ao mesmo tempo, o manuscrito de 2025 me aponta novas direções. A insistência na temática do corpo, que resultou na série "
corpo poema", é uma veia que talvez mereça um aprofundamento futuro. A linguagem em Poemas 2025 é mais solta, por vezes fragmentada, capturando o pensamento no calor do momento, enquanto em Poéticas cada palavra foi pesada para caber em uma arquitetura maior.


No fim, vejo que um não existe sem o outro e ambos fazem parte de um
projeto poético que segue em curso com os 18 livros que até aqui publiquei.. Poéticas do Cuidado é o destino, o mapa que tracei para entender meu lugar no mundo através da palavra. Poemas 2025 é a própria caminhada, com seus tropeços, suas paisagens inesperadas e suas novas trilhas e, sobretudo, a confirmação de minha est(ética) existencial. É o testemunho de que, para mim, a poesia é menos um destino e mais um modo de caminhar, reafirmando a cada dia que sou um "animal poético, / existencialmente est(ético)".


Deixo aqui meu convite para que conheçam minha obra.


@GiovaniMiguezz

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